Conteúdo

A relicitação regulamentada – Decreto nº 9.957, de 6 de agosto de 2019

Por

Por Daniel Versoza Alves, Trainee do Núcleo Contencioso e graduando em direito pela Universidade Federal do Paraná.


Conforme abordado em outro artigo[1], a relicitação foi criada com o propósito de tornar mais eficiente e menos burocrática a rescisão de contratos de parceria nos setores rodoviário, ferroviário e aeroportuário, reduzindo entraves para a substituição de empresas contratadas pela Administração Pública, com o objetivo de viabilizar a continuidade, regularidade e eficiência na prestação dos serviços prestados aos usuários.

Recentemente foi promulgado decreto regulamentador do procedimento de relicitação: o Decreto n°. 9.957/2019[2].  A normativa explicita os princípios, regras, condições e obrigações das partes aplicáveis no desenrolar do processo.

A ideia central da relicitação consiste na extinção amigável do contrato de parceria (inclusive, este poderia ser um nome mais adequado para o instituto). Isso é feito pela substituição da empresa concessionária (contratada) que esteja com dificuldades para entregar o empreendimento ou serviço contratado, por meio de novo processo de licitação, com novas condições e um novo contratado.

Na prática, se uma empresa concessionária no âmbito federal perceber que terá dificuldade para cumprir o contrato, poderá solicitar a relicitação à agência reguladora competente.

O requerimento deve ser feito por escrito (art. 3º) e deve apresentar justificativa do pedido, declaração de renúncia ao prazo para correção de falhas, declaração de intenção de aderir de forma irrevogável e irretratável à relicitação, renúncia à participação no contrato que está sendo relicitado, informações sobre ativos tangíveis e intangíveis existentes, e indicação de condições, obrigações e subcontratos vinculados ao contrato de parceria a ser relicitado.

Recebido o pedido, a agência reguladora deverá se manifestar sobre a viabilidade técnico-jurídica do requerimento (art. 4º), remetendo o processo ao Ministério da Infraestrutura, que analisará sua compatibilidade às questões políticas relacionadas ao setor correspondente (art. 5º).

Assim, com os dois pareceres acima, o processo será remetido ao Conselho do Programa de Parcerias de Investimentos da Presidência da República que opinará sobre a conveniência e oportunidade da relicitação. O posicionamento final acerca do pedido caberá ao Presidente da República, que definirá sobre a qualificação do empreendimento no PPI (art. 6º). Se qualificado, qualquer processo de caducidade em curso será suspenso (art. 5º, §2º).

Em síntese, a tramitação processual da relicitação percorre o seguinte fluxo:

Com o aval da Presidência, caberá à agência reguladora competente ou ao Ministério da Infraestrutura abrir nova licitação para que outra empresa seja habilitada e classificada, em procedimento semelhante à licitação comum (arts. 9º e 10), com o estudo técnico e econômico do empreendimento, publicação de edital de licitação e gestão futura do contrato a ser firmado (art. 7º).

Aqui entra a peculiaridade do processo de relicitação: com a escolha da empresa substituta, deverá ser firmado Termo Aditivo ao contrato de parceria (art. 8º), do qual farão parte o ente concedente, a empresa substituta e a empresa substituída.

Um possível entrave à operacionalização da relicitação decorre da previsão de obrigações do contratado originário, que deverão ser  observadas até a extinção do contrato de parceria, tais quais (i) não distribuir dividendos ou remunerar acionistas; (ii) não reduzir seu capital social; (iii) não alienar, ceder, transferir, dispor ou constituir ônus, penhor ou gravame sobre bens ou direitos vinculados ao contrato de parceria; e (iv) não requerer falência, recuperação judicial ou extrajudicial da SPE (art. 8º, inc. XI).

Destaque positivo, além da adoção obrigatória da arbitragem (art. 8º, IV), é a previsão de que no Termo Aditivo deve constar a obrigação do futuro contratado de pagar indenizações referentes a bens reversíveis não amortizados ou depreciados eventualmente devidas pelo poder concedente ao contratado original (art. 8º, inc. XV).

Para o cálculo final da referida indenização, deverão ser descontadas eventuais multas devidas pelo contratado originário, outorgas devidas até a extinção do contrato de parceria e o valor excedente da receita tarifária auferida pelo contratado originário em razão dos valores não contabilizados decorrente da suspensão das obrigações de investimentos não essenciais (art. 11). Seguradoras devem estar atentas para a observância e acompanhamento dos procedimentos de liquidação que deverão ser acompanhados e certificados por empresa de auditoria independente (art. 7º, parágrafo único e art. 11, §3º).

Por fim, as disposições finais do Decreto trazem a possibilidade de criação de um comitê técnico exclusivamente para o acompanhamento do processo de relicitação pelo Conselho da Presidência (art. 13), bem como disposição expressa de que o processo de relicitação não poderá levar a qualquer responsabilidade do poder concedente acerca de encargo, ônus, obrigações ou compromissos com terceiros ou empregados dos contratos originários ou futuros (art. 12).

O que se percebe é que o cenário político-econômico atual está mais preocupado com a preservação da empresa, a continuidade da prestação do serviço público e a efetiva entrega de obras contratadas pela Administração, de forma alinhada à satisfação do interesse público e buscando o desenvolvimento do país. Nesse cenário, a relicitação atende aos ideais de simplificação dos procedimentos e desburocratização da Administração Pública.

Contudo, por ser procedimento novo e permeado de incertezas sobre sua efetividade, cabe às empresas interessadas em aderir ao processo de relicitação e às futuras contratantes estarem bem orientadas juridicamente, a fim de garantir que o processo e o futuro contrato sejam bem estruturados, levando em conta os direitos e deveres de cada uma das companhias.

Para tanto, a Poletto & Possamai Sociedade de Advogados conta com a expertise imprescindível para resguardar os interesses das companhias em processo de relicitação.

[1] https://poletto.adv.br/a-relicitacao-na-lei-no-13-448-2017/
[2] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/decreto/D9957.htm

Compartilhe nas redes sociais

Newsletter

Assine e receba nossas atualizações e conteúdos ricos exclusivos