
O atual Código de Processo Civil foi idealizado e promulgado com a finalidade de propiciar a confluência entre o direito processual civil e a Constituição Federal de 1988, em especial seus princípios basilares. Dentre eles cita-se a duração razoável do processo, sua finalidade social e, sobretudo, a segurança jurídica das decisões proferidas, as quais devem fundar-se nos pilares constitucionais da dignidade da pessoa humana, da proporcionalidade e da razoabilidade.
Os estudos para a implantação de um sistema de precedentes judiciais no ordenamento jurídico brasileiro tiveram início já em períodos anteriores à própria promulgação do CPC 2015, quando a discussão já era objeto de análise por juristas que verificaram a necessidade de uma maior uniformidade nas decisões judiciais brasileiras, visando a tão necessária segurança jurídica. Como disciplinou Luiz Guilherme Marinoni, quando menciona que “A insegurança jurídica e a absoluta imprevisibilidade das decisões judiciais, têm instigado a refletir a respeito da necessidade de um sistema legal coeso, que possibilite ao jurisdicionado, ao menos, programar suas condutas de acordo com o direito”.¹
Em suma, a ideia de se criar e aplicar um sistema uniforme de precedentes em nosso ordenamento jurídico, surge para assegurar aos jurisdicionados uma maior estabilidade nas decisões proferidas.
Neste sentido, idealmente, a criação dos procedentes ficaria relegada às denominadas Cortes de Precedentes, como o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ), as quais fazem a análise dos casos concretos e analisam a possível criação de um precedente a ser seguido nacionalmente quando realizam o controle abstrato de constitucionalidade, ou seja, quando analisam os casos que sobem às instâncias superiores através dos recursos especiais e extraordinários analisando sua constitucionalidade ou inconstitucionalidade sob viés de determinada norma ou a aplicação ou não de determinada lei federal.
Além da criação de precedentes judiciais através da análise de recursos especiais e extraordinários, nossas cortes superiores contam com mais uma tutela recursal a fim de efetivar e afirmar seus entendimentos, evitando a divergência e decisões conflitantes. Trata-se dos embargos de divergência, previsto nos artigos 1.043 e 1.044 do Código de Processo Civil, o qual tem como finalidade justamente dirimir a divergência de entendimentos entre os órgãos colegiados, formando a partir dos acórdãos decisórios precedentes vinculantes, a serem seguidos pelas próprias cortes e demais julgadores.
Portanto, com a vigência do Código de Processo Civil, a ideia de criação e de utilização de precedentes judiciais em nosso ordenamento jurídico passou de uma mera idealização para realidade.
O que se verifica, entretanto, é que passados 10 anos da entrada em vigor do CPC, há pouco avanço quanto a uma definitiva e substancial aplicação prática dos precedentes.
Um dos esforços a que se chama atenção, é criação de uma estratégia nacional de consolidação do sistema de precedentes obrigatórios, instituída como uma meta do CNJ a ser atingida entre os anos de 2021 a 2026, a qual tem entre suas finalidades, a criação de um banco nacional de precedentes (BNPR), a implantação de grupos de trabalho destinados à elaboração de estudos e de propostas voltadas ao fortalecimento dos precedentes judiciais, e a integração entre núcleos de gestão de precedentes e centros de inteligências nos tribunais.
Entretanto, na prática cotidiana dos operadores do Direito, os precedentes judiciais ainda se mostram uma teoria distante, a qual necessitará de um longo percurso de discussão e implementação. Neste sentido, o plano de ação criado pelo CNJ vai de encontro ao intuito do estudo e da teoria de uma criação de um sistema de precedentes judiciais aplicados ao ordenamento jurídico brasileiro, porém, sua viabilidade e aplicabilidade necessitaram de um esforço conjunto entre a academia, doutrinadores, juristas, advogados e membros da carreira jurídica para que o resultado seja aplicável.
Em resumo, o que se observa é que apesar de importante e necessária a ideia de criação de um sistema de precedentes dentro do nosso ordenamento jurídico, sua elaboração e aplicação ainda estão longe da idealização trazida originalmente pelo Código de Processo Civil, ainda que seja possível verificar que existem avanços quanto a criação de um sistema de precedentes, sua aplicação prática demanda estruturação e implantação progressiva.
Notas de Rodapé
¹MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes obrigatórios. 5.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016.