No seguro-garantia a modalidade de Adiantamento de Pagamento confere segurança as relações contratuais onde o contratante realiza pagamento antecipado ao contratado para a execução do objeto contratual. Esta modalidade garante ao Segurado (credor da obrigação contratual), a indenização sobre os valores adiantados e não amortizados na forma prevista do contrato, em razão de descumprimentos de obrigações do Tomador.
A cobertura securitária nas apólices de seguro-garantia na modalidade Adiantamento de Pagamento, não raro, gera controvérsia em razão das diversas possibilidades para que se considere que o valor adiantado tenha sido adequadamente utilizado ao fim que se destina. Isso porque a dinâmica de funcionamento da cobertura pode variar em razão do critério de amortização do adiantamento estipulado contratualmente.
Na prática, esta vinculação à regra de amortização do contrato se traduz na dificuldade em delimitar qual é o prejuízo efetivamente coberto pela apólice nesta modalidade e qual seria o prejuízo coberto por outra modalidade de garantia prevista no contrato (uma apólice de seguro-garantia de performance, por exemplo).
Conforme ensina Gladimir Poletto, existem três interpretações para a cobertura securitária no seguro-garantia de adiantamento de pagamento: i) o bom uso do valor adiantado, que diz respeito ao investimento do montante antecipado em insumos e recursos necessários para dar início à execução contratual; ii) a execução de fase específica dos serviços ou construção, onde o valor do adiantamento é abatido a medida que determinada parte da obra/serviço é entregue; e iii) a amortização conforme fixação expressa do cronograma-físico financeiro até o término da execução contratual. [1]
Na ocorrência de sinistro – rescisão contratual – os segurados usualmente reclamam diversos tipos de prejuízos sob a apólice de adiantamento de pagamentos. Contudo, ainda que a existência destes prejuízos fique comprovada, a obrigação de indenizar da Seguradora nesta modalidade está restrita à amortização do adiantamento de pagamento.
Este foi o entendimento recente do Tribunal de Justiça de São Paulo no julgamento da Apelação n° 1130991-82.2016.8.26.010, em que o Apelante (Segurado) buscava reverter a negativa de indenização securitária do Apelado (Seguradora) proferida no âmbito de regulação de sinistro envolvendo apólice de seguro-garantia na modalidade de adiantamento de pagamentos.
O Relator do caso, Des. Luíz Roberto Torro, entendeu que, não obstante o inadimplemento do objeto contratual, a execução superior a 10% (dez por cento) da obra permite concluir que o adiantamento de pagamento foi totalmente amortizado, estando os demais prejuízos decorrentes de descumprimentos de obrigações associados somente à apólice de performance.
Ainda, destacou que:
O avanço das obras corresponde a gradual absorção do adiantamento que as custeia e de forma progressiva de insubsistência da garantia até alcançar o montante proporcional representado pela quantia adiantada em relação ao preço. A exigência da garantia não se relaciona a um todo e qualquer inadimplemento do contrato principal, mas somente ao associado à não utilização do adiantamento. [2]
Trata-se de julgado importante para delimitar a cobertura nas apólices de adiantamento de pagamento, esclarecendo que a proteção oferecida por esta modalidade de seguro se limita à amortização do pagamento antecipado conforme evolução da obra (caso seja assim estipulado contratualmente), e que, ainda que existam demais descumprimentos, estes não podem ser considerados como prejuízos passíveis de indenização nesta modalidade.
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[1] POLETTO. Gladimir Adriani. O Seguro-Garantia: eficiência e proteção para o desenvolvimento – São Paulo: Editora Roncarati, 2021. p 140-145.
[2] TJSP – Acórdão 2022.0000979567, Apelação Cível nº 1130991-82.2016.8.26.0100 – Voto nº 1802, Relator: Luíz Roberto Reuter Torro, 27ª Câmara de Direito Privado, data de julgamento: 08/11/2022, publicado no PJe: 29/11/2022].