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Contratos administrativos, crise e variação cambial

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Por Luiz Augusto da Silva, Mestre em Direito do Estado pela UFPR e advogado do Núcleo Contencioso na Poletto e Possamai Sociedade de Advogados.

Quais as consequências jurídicas da variação cambial decorrente da pandemia para os contratos administrativos? A alta brusca da moeda estrangeira determina que tais contratos sejam revisados?

No Direito Privado, a jurisprudência majoritária resiste em admitir que mudanças no câmbio – e outros fatores macroeconômicos, como inflação ou crises no mercado internacional – sejam tomadas como fato extraordinário e imprevisível a permitir a revisão de negócios[1]. Impera o pacta sunt servanda.

Já nos contratos administrativos, a proteção reforçada ao seu equilíbrio econômico-financeiro os torna mais permeáveis a alterações por conta da variação cambial (art. 37, XXI, da Constituição; art. 65, II, “d”, da Lei 8.666/93). Por equilíbrio (ou equação) econômico-financeiro se entende: “a relação entre encargos e vantagens assumidas pelas partes do contrato administrativo, estabelecida por ocasião da contratação, e que deverá ser preservada ao longo da execução do contrato”[2].

O Tribunal de Contas da União, no Acórdão 1.431/2017, definiu três requisitos do reequilíbrio contratual por força do câmbio:

  • Primeiro: o fato deve gerar consequências incalculáveis; impossíveis de serem previstas pelo gestor médio quando da vinculação contratual.
  • Segundo: deve romper a equação econômico-financeira de modo drástico, tornando o ajuste excessivamente oneroso a uma das partes. Para tanto, a variação cambial deve fugir à flutuação cambial típica do regime de câmbio flutuante.
  • E terceiro: não basta que o contrato se torne oneroso; os custos elevados devem retardar ou impedir a sua execução.

Também o Superior Tribunal de Justiça oferece precedente importante. No caso, o Tribunal acolheu o pleito de reequilíbrio econômico-financeiro de empresa contratada para fornecer helicópteros à União – veículos comprados no exterior, em dólar, e cujo custo aumentou com a desvalorização severa do real em janeiro de 1999 (no contexto de planos econômicos para combater a inflação).

Consta nos fundamentos do julgado: “[…] caso sobrevenha variação cambial significativa e inesperada, com a constatação de oneração excessiva do contrato e o rompimento da equação econômico-financeira firmada, de rigor que se efetue a repactuação prevista no já referido art. 65, inciso II, d, da Lei 8.666/1993.” (STJ, REsp n°. 1.433.434-DF, Primeira Turma, Rel. Min. Sérgio Kukina, DJe 21.3.2018).

A pandemia, enquanto fato por si só considerado, preenche os requisitos de extraordinariedade e imprevisibilidade. O mesmo se diga do aumento do valor comparativo de moedas estrangeiras que ela causou. Seja como for, os efeitos de tais ocorrências sobre cada contrato administrativo – como a onerosidade excessiva das prestações e dificuldades na execução – merecem ser avaliados caso a caso, à luz da específica matriz de riscos do ajuste.

A equipe da Poletto e Possamai está à disposição de seus clientes para auxiliar na tutela do equilíbrio dos contratos, a fim de construir soluções eficientes e seguras.


[1] Por exemplo: STJ, REsp n°. 936.741-GO, Quarta Turma, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, DJe 08.3.2012; STJ, AgInt no Agravo em REsp n°. 646.945-SP, Terceira Turma, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 28.6.2016.

[2] JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. 12ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 602.

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