Embora a ferramenta dos Trusts seja muito conhecida internacionalmente na gestão patrimonial, no Brasil somente foi parcialmente regulamentada ao final do ano de 2023 sob a Lei n° 14.754/2023, que dispõe sobre a “tributação de aplicações em fundos de investimento no País e da renda auferida por pessoas físicas residentes no País em aplicações financeiras, entidades controladas e trusts no exterior”, porém, só é mencionado quanto a sua tributação e não sua aplicação, a qual está sendo discutida no Projeto de Lei Complementar n° 145/2022.
Assim, os Trusts são muito utilizados no planejamento patrimonial e sucessório, de forma que será contratado um terceiro para fazer a gestão do patrimônio e garantir que seus herdeiros o recebam no momento desejado, sem a necessidade de um testamento.
Nesse contrato, temos a figura do “settlor”, quem cria o Trust e cuidará do patrimônio elaborando uma estratégia; “trustee”, o administrador dos bens, devendo prestar contas sobre o seu trabalho, ficando vedada a delegação de suas funções; e os “beneficiários”, os quais vão receber os benefícios administrados pelos contratados. Cabe ressaltar que essa ferramenta de gestão poderá ser para mais de um beneficiário e não somente um, bem como, ao contratar o Trust, será estabelecido termos e condições dos patrimônios, definindo o momento que será transferido aos beneficiários.
Também, existe a possibilidade da contratação de mais uma figura nomeada “protector”, a qual basicamente irá fiscalizar o trabalho do trustee, verificando se está administrando o patrimônio em prol dos beneficiários. Ainda que não seja considerada uma figura obrigatória, a contratação deste se torna extremamente relevante para fins de estabelecer segurança jurídica para o contratante.
O Trust pode ser classificado em revogável ou irrevogável. O revogável é o tipo mais comum para garantir a continuidade do patrimônio familiar, em que o settlor pode reaver os bens transferidos a qualquer momento e, após sua morte, se torna irrevogável, permitindo que o trustee continue a gestão ou, menos frequentemente, encerre o trust e distribua o patrimônio aos beneficiários.
No irrevogável, o settlor não pode revogar o trust e perde a propriedade dos bens transferidos. Isso oferece maior segurança aos beneficiários, já que o patrimônio no Trust não pode ser atingido por ações judiciais contra o settlor, pois legalmente não lhe pertence mais.
Para haver extinção do Trust, basta que no caso, o trustee deseja se desligar da administração do patrimônio, não havendo a substituição deste, será automaticamente extinto, como também pode ocorrer quando o settlor desejar encerrar por algum motivo pessoal. Nesse último caso, há a possibilidade do administrador se colocar como primeiro beneficiário dos patrimônios, pois em caso de extinção, serão transferidos para ele primeiramente decidir se repassará para alguém ou constituirá um novo Trust.
Conforme a Lei 14.754/23, Trusts são tributados anualmente a 15%, mesmo que o dinheiro esteja no exterior, com pagamento antecipado similar aos fundos exclusivos. Assim, os bens no trust são transferidos aos beneficiários na distribuição ou na morte do proprietário, o que ocorrer primeiro, até então, a titularidade é do criador do Trust, que deve declarar o patrimônio pelo custo de aquisição. Portanto, mudanças de titularidade em vida são tratadas como doação e, após a morte, como herança, sujeitando-se ao Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD).
Nesse sentindo, os Trusts possuem certas vantagens, como a proteção de seus bens em ações judiciais, visto que seus ativos após a contratação desse instrumento não são mais considerados propriedade direta do Settlor, tornando-os menos acessíveis a terceiros. Além disso, possuem uma certa flexibilidade em se adaptar, podendo ser ajustados para atender às necessidades específicas do Settlor e dos beneficiários, que estabelecendo regras claras e termos específicos, acaba evitando disputas familiares sobre a distribuição de ativos após a morte do Settlor, garantindo que suas intenções sejam respeitadas.
Trusts são úteis também para proteger e gerenciar ativos destinados a crianças e beneficiários menores de idade, garantindo que os recursos sejam usados de forma responsável e conforme as necessidades dos menores.
Como pontos negativos, é importante relembrar que até o momento, ainda não temos uma lei regulamentando o uso deste instrumento, o que pode ocasionar uma insegurança jurídica e até mesmo à prática de atos ilícitos. Por este motivo, é de extrema relevância a promoção do Projeto de Lei Complementar pelo Poder Legislativo para que seja discutida a situação e regularizada.
Referências
LEI Nº 14.754, DE 12 DE DEZEMBRO DE 2023. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2023/lei/l14754.htm
A origem dos trusts no direito inglês e seu uso no Brasil. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2024-jun-26/a-origem-dos-trusts-no-direito-ingles-e-seu-uso-no-brasil/
Trust: entenda como funciona e quais os impactos na gestão patrimonial. Disponível em: https://www.infomoney.com.br/guias/trusts/
Trust: estrutura pode facilitar planejamento patrimonial e sucessório. Disponível em: https://www.nordinvestimentos.com.br/blog/trust-estrutura-pode-facilitar-planejamento-patrimonial-e-sucessorio/
A UTILIZAÇÃO DE OFFSHORE E TRUST COMO INSTRUMENTOS DE PLANEJAMENTO PATRIMONIAL. Disponível em: https://repositorio.animaeducacao.com.br/items/50d79978-c82b-4e77-b66f-498d53ffaea3