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A Taxa Selic e sua aplicação nos Processos Judiciais Cíveis

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A discussão sobre os critérios de atualização monetária e a aplicação de juros moratórios em ações cíveis sempre gerou divergências entre juristas e tribunais. Trata-se de um tema que, à primeira vista, pode parecer apenas técnico, mas que, na prática, repercute no valor que será pago ao vencedor do processo

Nos últimos anos, a Taxa Selic deixou de ser apenas um instrumento de política econômica do Banco Central para ganhar foco no processo civil. O Superior Tribunal de Justiça tem se debruçado sobre o tema e fixado entendimentos que colocaram a Selic como um índice central na atualização de condenações judiciais.

A Selic não é um índice comum. Ao contrário do IPCA-E ou do INPC, que medem apenas a inflação, a Selic já traz em sua fórmula tanto a correção monetária quanto os juros moratórios. Em outras palavras, quando aplicada, elimina-se a necessidade de soma de índices e evita-se a duplicidade de encargos.

Originalmente, a Selic foi pensada como taxa de referência para as operações do Banco Central. Com o tempo, contudo, passou a ter respaldo legal, sendo prevista como índice aplicável aos créditos tributários da União (art. 13 da Lei nº 9.065/1995 e art. 30 da Lei nº 10.522/2002). Essa previsão normativa abriu espaço para que o Judiciário começasse a expandir sua aplicação para o campo cível.

O debate acerca da adoção da Selic no âmbito dos processos judiciais ganhou ainda mais relevância após o advento da Lei nº 14.905/2024, que, dentre outras alterações, padronizou a interpretação do art. 406 do Código Civil para adotar a Selic como critério de atualização nos casos em que não houver previsão na lei ou em contrato.

Esse dispositivo está alinhado com o entendimento estabelecido no julgamento do REsp 1.795.982/SP (2024), em que a Corte Especial do STJ deixou claro o papel da Selic como fator de correção das dívidas civis. No voto vencedor, ficou consignado que:

“A taxa Selic, por englobar correção monetária e juros moratórios, deve ser aplicada como critério de atualização das dívidas civis, afastando-se a incidência concomitante de outros índices ou juros de 1% ao mês” (REsp 1.795.982/SP, Corte Especial, julgado em 21/8/2024).

Seguindo a mesma linha, no AgInt no AREsp 2.059.743/RJ (2025), a Quarta Turma reafirmou o posicionamento do sentido de estabelecer a Selic como índice único nas hipóteses em que a sentença não indicar expressamente o critério de juros moratórios. O tema, porém, ainda não está totalmente pacificado. O acórdão destacou que:

“Nas hipóteses em que a sentença não estipula de forma expressa os critérios de juros e correção monetária, deve incidir a taxa Selic como índice único, evitando-se a cumulação de encargos” (AgInt no AREsp 2.059.743/RJ, Quarta Turma, julgado em 11/2/2025, DJe 20/2/2025).

Em junho de 2025, o vice-presidente do STJ admitiu recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal (REsp 1.795.982/SP) para que a Corte analise a metodologia de cálculo da Selic. A controvérsia é se a apuração deve ser feita pela soma dos acumulados mensais ou pela multiplicação dos fatores diários. À primeira vista, pode parecer um detalhe técnico, mas a diferença é significativa, soma mensal, em alguns cenários, pode resultar em percentual até inferior à inflação, comprometendo o princípio da reparação integral.

Na prática forense, essa não é uma discussão abstrata. É o tipo de detalhe que muda o valor de uma execução. Em determinadas condenações, a aplicação da Selic ou IPCA-E com juros de 1% ao mês pode resultar em uma diferença considerável de valores.

Ou seja, a partir de agosto de 2024 não resta mais dúvida, seja pela nova lei, seja pela posição do Superior Tribunal de Justiça, a Selic é o índice aplicável. A controvérsia está no período anterior, pois muitos tribunais locais ainda hoje aplicam juros de 1% ao mês somados a índices de correção monetária, prática que não condiz o entendimento do STJ. Isso porque, para a Corte, mesmo antes da alteração legislativa, o art. 406 do Código Civil já apontava a Selic como a verdadeira taxa legal.

De todo modo, o entendimento predominante do Superior Tribunal de Justiça é o de que a Selic deve ser aplicada quando não houver previsão legal ou contratual, ou, na falta de definição expressa na sentença, como índice único.

Em resumo, a discussão sobre a Selic vai além de fórmulas matemáticas. O que está em jogo é a busca pelo equilíbrio entre reparação integral ao credor e segurança jurídica para o devedor.

Acompanhar os desdobramentos no STJ e futuramente no STF, é fundamental para quem atua no contencioso cível, já que a adoção do índice pode alterar de forma decisiva o resultado econômico de um processo.


Referências:

STJ – Corte Especial. REsp 1.795.982/SP, julgamento em 21 de agosto de 2024. Disponível em: https://www.stj.jus.br/publicacaoinstitucional/index.php/Informjuris20/article/viewFile/13125/13229

STJ – Quarta Turma. AgInt no AREsp 2.059.743/RJ, julgado em 11 de fevereiro de 2025 (DJe 20/2/2025). Disponível em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2025/12032025-Selic-deve-ser-aplicada-como-juros-moratorios-se-sentenca-nao-determinar-outra-taxa.aspx

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